Reprodução do artigo de JR. GUZZO para revista Exame.
Nada como a majestade do estado brasileiro – esse entre superior que, embora tenha receita errada para quase tudo, continua sendo levado a sério pelos economistas, políticos e lideranças do “campo progressista”; faz “políticas públicas” para qualquer tipo de questão que lhe aparecer pela frente, do desenvolvimento dos metais não ferrosos à atuação dos conferentes de carga nos cais de porto; detém recordes mundiais em matéria de custo fora de propósito e prestação de serviço miserável. O Estado brasileiro, esse mesmo que se pode ver aí, é hoje o pior inimigo do Brasil e de sua população, sobretudo a mais pobre. Ou melhor: está nesse papel há anos e, quanto maior o prejuízo que dá, tanto maior seu prestígio entre as nossas classes intelectuais e políticas. Não há exemplo, prova ou contraprova que cheguem. A cada dia a realidade demonstra, com a clareza do sol, que a função da sociedade brasileira neste começo de século é pagar imposto para sustentar a máquina pública — seu funcionamento, sua folha de salários, suas aposentadorias com salário integral, suas licenças-prêmio, seus carros chapa branca, seus vales-refeição, seus auxílios-moradia, seus cartões de crédito “corporativos”, suas pensões vitalícias e mais 1001 vigarices por meio das quais se roubam os cidadãos por meios legais. A cada dia as forças que mandam ou influem no Brasil exigem “mais Estado”. Não há potência externa, com a possível exceção da corte de Lisboa durante os 300 anos de colônia, que tenha nos explorado tanto assim.
Até algum tempo atrás, era comum, no meio dessa calamidade toda, ouvir dizer que dois símbolos sacrossantos do “Estado brasileiro”, pelo menos esses dois, conseguiam ficar mais ou menos acima do lixão onde jazem três quartos do aparelho estatal, ou algo assim: a Petrobras e o Banco do Brasil. A Petrobras, como é do conhecimento geral, morreu. Sobrevive em suas operações diárias e no mercado, é claro, porque uma empresa que tem o monopólio da exploração, do refino e da venda do petróleo num país do tamanho do Brasil não desaparece, por mais esforço que seus administradores façam para destruí-la. Se não conseguiram nem na Venezuela, aqui também não conseguiriam. Mas, desde o início da Operação Lava-Jato, a Petrobras dos governos LuIa e Dilma Rousseff virou uma piada, em termos de desmoralização, incompetência e corrupção enlouquecida — sofreu um surto de terceiro-mundismo em modo extremo, naquilo que o terceiro-mundismo tem de absolutamente pior. Em matéria de roubalheira, então, jamais se viu algo comparável em todo o planeta; para tentar encontrar um equivalente seria preciso procurar em outra galáxia, sob outras formas de vida. Sobrava, aí, o Banco do Brasil, apesar de carimbado no mensalão e em outros episódios soturnos. Não sobra mais. No balanço do último trimestre de 2016, que acaba de ser divulgado, o lucro do banco caiu mais de um terço em comparação com o mesmo período do ano anterior. Numa época em que todos os bancos brasileiros estão tendo lucros históricos, o santo dos santos da finança estatal mal consegue ganhar alguma coisa — pouco acima de 1,7 bilhão de reais, o que até parece um monte de dinheiro, mas, na estratosfera em que vive a área bancária, é um resultado abaixo de sofrível. O Itaú ganhou mais de três vezes isso, ou 5,5 bilhões; passou na frente do BB em ativos totais e se transformou no maior banco brasileiro.
É verdade que as ações do BB estão em alta, que ajustes vêm sendo feitos em sua estrutura e que a nova diretoria pretende se equiparar em lucratividade aos bancos privados. Enquanto isso, os 14 bilhões de reais de diferença entre os lucros do Itaú e os do Banco do Brasil em 2016 — de 22 para 8 bilhões de reais — saem diretamente de seu bolso; é onde deveriam estar e não estão. Ninguém, é claro, pensa em mudar nada nisso aí. Anos atrás, o candidato da oposição nas eleições presidenciais vestiu uma camiseta dizendo que amava a Petrobras. Que chance tem um país quando os dois lados estão errados
Fonte: Exame