Frequentemente classificados de vilões dos investimentos por “empurrar” aplicações pouco adequadas em busca de metas, os gerentes de bancos são agora cobiçados por novas empresas que competem com instituições tradicionais. Empresas como XP, Fiduc e Novi e escritórios autônomos têm contratado esses profissionais em busca de suas carteiras já “gordas” de clientes e conhecimento de produtos financeiros.
A favor na sedução, está o enxugamento dos bancos. Desde 2014, o número de vagas de gerentes de banco no Brasil encolheu em 24,8 mil, segundo dados do Ministério do Trabalho.
A XP tem sido a mais agressiva na estratégia. A corretora veiculou recentemente na internet campanha publicitária para converter profissionais de banco que estejam “precisando se reencontrar na carreira”. Ela quer que eles se convertam em agentes autônomos de investimento (AAI), que atuam por conta própria oferecendo produtos da corretora. De acordo com Caio Peres, chefe de expansão da XP, 2.200 dos agentes associados eram gerentes de bancos, ou 60% de sua base.
— No banco, ele desempenha funções que não quer desempenhar. Mas tem know-how, relaciona-se bem e gosta do universo de investimentos. É mais rápido fazer esse profissional entender nosso modelo do que um engenheiro. Cai como uma luva — disse Peres.
Os gerentes são parte relevante dos 332 mil profissionais com certificações CPA-10 e CPA-20 da Anbima, associação de instituições financeiras. Elas são exigidas de quem distribui produtos de investimento. Para atuarem como AAI, precisam ainda passar na prova da Ancord, associação de corretoras. Dos que fazem o exame, 60% vieram dos bancos, informou o vice-presidente Edgar Ramos Silva.
Queixa recorrente entre os profissionais que fizeram a transição de carreira era a necessidade de bater as metas de venda comuns nos bancos.
— Às vezes, o cliente nem tem condições de comprar o produto mas, por fidelidade, sente-se responsável por ajudá-lo. Acaba sendo moeda de troca — disse Nilton Ramos, ex-gerente de um grande banco de varejo que atua na Novi, de crédito com garantia.
Há cinco meses, Marcio Fabian deixou seus 14 anos em um banco de varejo alta renda para se associar ao Prosperidade Investimentos. Não foi o primeiro: o escritório de AAI fora fundado há dois anos por colegas de banco e tem hoje 20 ex-funcionários da instituição.
Renda média é de R$ 15 mil, diz corretora
Foi uma decisão difícil, que levou três meses para ser tomada, admite. Fabian estava em processo de promoção, ganhava bom salário e trabalhava em uma das principais agências, na Avenida Paulista. Mas se sentia desconfortável com a necessidade de bater metas, desde a abertura de contas até a venda de seguros:
— Muitas vezes não sabíamos se ficávamos do lado do cliente ou do banco.
Também pesou na decisão a limitação de investimentos que podia oferecer aos clientes, uma vez que a plataforma do banco não era aberta a produtos de outras casas. Fabian calcula que já tenha conseguido transferir 40 clientes do banco para sua nova casa, com tíquete médio de R$ 1 milhão. Mesmo assim, ele admite que, financeiramente, a mudança só se pagará em alguns anos. Este ano, deve ganhar 40% menos.
A renda do agente autônomo depende do seu desempenho, mas, em média, ganham cerca de R$ 15 mil mensais, disse Peres, da XP.
Na Faros Investimentos, com R$ 5,3 bilhões sob custódia na XP, 15 dos 40 assessores vieram de bancos, sobretudo do segmento private.
— Miramos gerentes que tenham na faixa de R$ 800 milhões a R$ 2 bilhões na carteira no banco, com a meta de convertermos pelo menos 20% disso — contou o sócio Samy Botsman.
Raphael Pimentel, de 33 anos, é um deles. Após oito anos como gerente do private de um banco estrangeiro no Rio, mudou-se há dois anos para a Faros, atraído, disse, pela meritocracia.
— Agora eu vou receber de acordo com o que produzir. No banco, você tem salário e comissões, mas o resultado não é transparente.
‘Conflito de interesse’
Mas se os gerentes são criticados pela oferta de investimentos inadequados apenas para cumprir metas, o modelo de agentes autônomos também não é poupado.
— O agente da corretora não se importa se o cliente assumir risco em excesso. Ele ganha por operação, e existem produtos que pagam mais a ele, sobretudo os mais arriscados. Isso cria outro conflito de interesse — disse Guilherme Baía, ex-superintendente de banco e, hoje, sócio da Fiduc.
A empresa é uma rede de planejadores financeiros que recebem 0,5% ao ano do patrimônio dos clientes trazidos para empresa (a Fiduc fica com outro 1%). A ideia é que eles não recebam nada de instituições financeiras, trabalhando exclusivamente para aumentar o capital do investidor. Operando há cerca de seis meses, já tem 150 sócios, dos quais metade era gerente ou superintendente de bancos.
— É um profissional superpreparado que, por razões exóticas à sua performance, como a consolidação dos bancos, está tendo que olhar para outras oportunidades — explicou o fundador Pedro Guimarães.
Segundo ele, quanto menor for a cidade, maior é a importância do ex-gerente na captação para a Fiduc, que está em mais de 30 cidades. Baía atuava em um banco público em João Pessoa e hoje foca na atração de investidores na Paraíba.
Marcio Fabian, da Prosperidade, disse ver sentido nas críticas contra o modelo das corretoras, mas considera a estratégia “um tiro no pé”.
— Se o assessor quiser ganhar muito dinheiro com produtos ruins, ele vai perder o cliente. É possível trocar o assessor com um simples clique — ponderou.